Por CBTM
Há sete anos à frente da seleção, treinador francês ajudou o país a alcançar feitos históricos
Daniel Leal, de Buenos Aires (ARG) – 20/3/2015
Em sua sétima temporada com a seleção, o treinador francês Jean-René Mounie já passaria facilmente por brasileiro. Conhece profundamente o tênis de mesa nacional, tem o carinho e o respeito de atletas e demais membros da comissão técnica e domina a língua portuguesa – apenas o sotaque europeu entrega suas origens. Em casa, Jean-René é um dos responsáveis pelo forte desenvolvimento da modalidade nos últimos anos, que levou a resultados históricos individuais e por equipes. Em entrevista ao site da CBTM, o treinador fez um balanço do trabalho e projetou os próximos passos a serem seguidos. Confira:
Como o tênis de mesa brasileiro evoluiu ao longo destes sete anos?
Com certeza, posso dizer que tivemos muitas mudanças. O nível dos atletas evoluiu muito. A primeira coisa é que temos muitos jogadores talentosos aqui. O Brasil tem muito potencial. E também há muita paixão pelo tênis de mesa, é uma vantagem importante. Meu primeiro trabalho foi construir uma equipe com os técnicos para que todos tivessem o mesmo conceito, o mesmo jeito de pensar. É fundamental para o alto nível.
A partir daí, qual a etapa seguinte?
Passo a passo, colocamos regras para os jogadores, que deveriam entender o que podemos esperar deles, como os níveis de disputa, foco, físico. Depois, começamos a trabalhar a técnica. Mas a primeira coisa foi explicar o caminho que deveriam seguir. Houve também uma grande evolução da parte estrutural da Confederação, que, hoje, é totalmente diferente do que tínhamos sete anos atrás. O todo é o que faz o resultado. Nenhum desses elementos isolados nos colocaria aqui.
Olhando para o futuro, quais os próximos passos do trabalho?
Hoje, temos muitos jogadores perto do top 50, top 70 do mundo, como Hugo, Cazuo e Gustavo. Mesmo Thiago, que, se não está tão acima na lista, tem nível para estar lá. Só no último ano, ele ganhou de nove jogadores top 80. E há vários jovens, como Jouti, Ishiy e Manhani, que podem brigar. Para dar um outro passo, temos de evoluir a parte técnica e seguir aprimorando a preparação para os eventos principais, desenvolvendo a forma de usar as ligas nacionais da Europa. E também o jeito de administrar a carreira de cada um.
O trabalho de base é uma das prioridades da CBTM. Qual a importância para o desenvolvimento do tênis de mesa brasileiro?
Se você tem uma base muito forte, você cria uma concorrência e fica mais fácil escolher e ter um ambiente de alto nível. Tentamos fazer isso com os brasileiros, mas, infelizmente, não temos um grande número de jogadores, mas já começamos a ir por esse caminho. O que queremos é aproveitar os resultados dos melhores para estimular essa base. Temos uma estratégia para isso, como o projeto Diamantes do Futuro, voltado para a detecção de talentos. O Ricardo Faria está à frente disso, trabalha com vários treinadores do Brasil. Temos uma relação para fazer tudo isso evoluir. O caminho é esse.
Historicamente, a França tem muito sucesso na detecção e formação de atletas. É uma referência?
A França tem uma força fantástica. A Federação Francesa tem 200.000 jogadores. Não dá para comparara com a China, mas, com qualquer outro país, eles estão muito à frente. O problema da França é um pouco diferente. Lá, o esporte cumpre um papel mais social. Querem administrar o dinheiro para o social, mas, no fim das contas, não há um projeto muito preciso no alto rendimento, para os melhores.
E qual caminho você enxerga para o Brasil?
Nos clubes, talvez haja um pensamento de que a CBTM coloque muito esforço nos melhores atletas. Mas como você acha que Tsuboi, que há cinco anos era o 200º do mundo, poderia chegar aos 35 melhores? Que Cazuo, então 210º, poderia ser top 45? Desenvolvemos um projeto individual para cada um deles. É claro que temos de fazer tudo para construir um sistema para o Brasil em relação à base, mas o alto nível deve seguir um outro caminho, bem mais individual do que a França fez. A França coloca muita energia para administrar a sua estrutura. Eu gostaria de colocar minha energia para pensar como cada jogador pode evoluir. O início do caminho aqui é o jogador, e não a estrutura. Na França, é o contrário. Quero, a partir do jogador, criar uma estrutura para ele. Estou certo de que esse é o melhor caminho para o Brasil. No caso da China, seria possível fazer uma mistura, mas, como o número de jogadores que temos é limitado, é o único caminho a seguir.
Este é o seu sétimo ano trabalhando com a seleção. O que o motivou a vir?
Quando decidi vir para o Brasil, foi muito por conta do Thiago Monteiro. Conhecia o (Hugo) Hoyama, mas ele não ia muito à Europa. Conheci o Thiago e tive muito respeito pela personalidade e pelo nível dele. Quando me chamaram, vi como um desafio interessante, também pelo ponto de vista cultural, aprender uma outra cultura. Gostei de sair de lá. Sou francês, mas me sinto muito bem no Brasil. As pessoas são muito abertas, a cultura é muito interessante. É um país bonito, com clima e comida interessantes. À parte do tênis de mesa, é uma experiência única, fantástica.
E a questão da língua, já entendia algo antes de se juntar à seleção?
Entendia um pouco de espanhol, mas, quando comecei a estudar português, cortei todo o espanhol, senão faria muita confusão. No início, não aprendi muito, porque todos falavam inglês ou francês. Mas comecei a trabalhar com jovens, especialmente o Hugo (Calderano). Quando você trabalha em um país por muitos anos e não fala bem a língua deles, acho que você não está o respeitando. Então, em 2011, comecei a fazer aulas, para melhorar passo a passo. Aprendi em seis meses, e depois continuei a melhorar me comunicando com todos. Mas há três semanas voltei a fazer aulas, porque acho que estava há muito tempo no mesmo nível. Quero falar de uma forma melhor, sem o sotaque francês.